Gaslighting: como identificar esse abuso emocional e recuperar sua autonomia

O que é gaslighting? Entenda essa forma silenciosa de manipulação

Gaslighting é uma forma de abuso psicológico onde uma pessoa manipula emocionalmente outra, fazendo com que ela duvide de sua própria memória, percepção ou sanidade. Esse comportamento ocorre frequentemente em relações afetivas, familiares, ambientes profissionais e até mesmo entre amigos. No Brasil, onde muitas vezes se valoriza a paciência, o perdão e o “dar uma segunda chance”, esse tipo de manipulação pode passar despercebido e ser confundido com preocupação ou amor.

O termo vem do filme “Gaslight” (1944), no qual um homem tenta enlouquecer sua esposa por meio de manipulações constantes. Atualmente, o gaslighting é amplamente reconhecido como uma forma grave de violência emocional. Este artigo tem como objetivo mostrar como reconhecer os sinais, quais os impactos e quais estratégias você pode adotar para se proteger e recuperar seu bem-estar.

Por que é tão difícil perceber que você está sendo manipulado(a)?

O gaslighting é sutil. Em vez de gritos ou ameaças explícitas, ele se expressa em frases como: “você está exagerando”, “isso nunca aconteceu” ou “você está ficando louca(o)”. O agressor muitas vezes se disfarça de cuidador, dizendo “é para o seu bem”. No contexto brasileiro, onde se evita conflitos diretos e há forte pressão social para manter relacionamentos, a vítima tende a duvidar de si antes de questionar o outro.

Frases típicas de gaslighting que merecem atenção

  • “Você entendeu tudo errado.”
  • “Você está sempre inventando coisa.”
  • “Ninguém mais pensa como você.”
  • “Você é muito sensível.”
  • “Se você me amasse de verdade, não faria isso.”

Essas falas servem para desacreditar os sentimentos e pensamentos da vítima, tornando-a cada vez mais dependente da validação do agressor.

Será que você está vivendo isso? Faça este teste rápido

  1. Você se sente confuso(a) ou culpado(a) após conversar com uma pessoa específica?
  2. Você começa a duvidar das suas lembranças ou sentimentos com frequência?
  3. Você se desculpa constantemente, mesmo sem saber o motivo?
  4. Você se sente cada vez mais isolado(a) de amigos e familiares?
  5. Você se pergunta com frequência se está enlouquecendo?

Se você respondeu “sim” a três ou mais dessas perguntas, é possível que esteja sofrendo gaslighting. Reconhecer isso é o primeiro passo para romper o ciclo.

As três fases mais comuns do gaslighting

  1. Idealização: O manipulador se mostra encantador, atencioso e confiável. Constrói vínculo emocional intenso.
  2. Desestabilização: Começa a invalidar emoções, confundir lembranças e distorcer fatos.
  3. Controle: A vítima perde a confiança em si mesma e passa a depender emocionalmente do agressor.

Esse ciclo pode durar meses ou até anos. Muitas vítimas só percebem o abuso depois de sofrerem consequências emocionais graves.

Onde o gaslighting é mais comum?

Acontece com mais frequência em relacionamentos amorosos, mas também pode ocorrer entre pais e filhos, amigos e em ambientes de trabalho. Um chefe que diz repetidamente que você está sempre interpretando mal as coisas, ou um parceiro que questiona sua memória o tempo todo, pode estar praticando gaslighting. No Brasil, de acordo com dados da Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres, mais de 27% das mulheres entre 18 e 49 anos relatam ter sofrido violência psicológica de parceiros.

Consequências emocionais reais e duradouras

Gaslighting pode levar a ansiedade, depressão, insônia, baixa autoestima e até sintomas de estresse pós-traumático. Em muitos casos, a vítima se sente sem saída ou com medo de buscar ajuda. O SUS oferece apoio psicológico gratuito por meio dos CAPS (Centros de Atenção Psicossocial) e das UBSs (Unidades Básicas de Saúde), sendo uma alternativa acessível para iniciar o tratamento.

Quando a sociedade minimiza: “Não é pra tanto” é parte do problema

Expressões como “todo casal briga” ou “isso é coisa da sua cabeça” reforçam a cultura de silenciamento. No Brasil, muitas pessoas ainda veem o sofrimento emocional como fraqueza. Mas o sofrimento psicológico é legítimo e precisa ser levado a sério. Minimizar essas vivências é negar a dor do outro e contribuir com o ciclo do abuso.

Primeiro passo para sair disso: registre o que você sente

Anote frases, situações, reações e como você se sentiu. Use um diário ou salve conversas que pareçam manipulativas. A leitura posterior desses registros pode ajudar a identificar padrões. Você começa a perceber que não está exagerando, e sim sendo desvalorizado(a) de forma sistemática.

O que fazer para se proteger

  • Converse com alguém de confiança ou procure um psicólogo.
  • Aprenda a dizer “não” e estabeleça limites claros.
  • Valorize seus sentimentos, mesmo que o outro os questione.
  • Evite justificar constantemente suas emoções.
  • Se necessário, afaste-se da pessoa manipuladora temporária ou definitivamente.

Reconstrução: como recuperar sua autonomia emocional

A saída do gaslighting não termina com o afastamento do agressor. É preciso reaprender a confiar em si mesmo(a). A terapia, o autocuidado, a reconexão com interesses pessoais e a escrita terapêutica são ferramentas valiosas. Retomar o controle é um processo, mas é possível e libertador.

Prevenção: confie na sua intuição e nos sinais do seu corpo

Se algo parece errado, mesmo que você não consiga explicar, leve a sério esse incômodo. Nossa intuição é um sistema de alarme emocional. Relações saudáveis não geram confusão constante. Se você se sente constantemente desvalorizado(a), questionado(a) ou culpado(a), algo está fora do lugar.

Ficar ou sair? A pergunta que exige coragem

Decidir terminar uma relação pode ser difícil, mas manter uma relação que destrói sua saúde emocional é ainda mais perigoso. Pergunte-se: “Essa relação me fortalece ou me enfraquece?” Se a resposta for negativa, talvez seja hora de se priorizar.

Conclusão: você não está exagerando, você está acordando

O gaslighting é eficaz porque opera no silêncio e na dúvida. Mas o momento em que você começa a questionar e registrar já é um ato de resistência. Suas emoções são válidas. Sua memória é real. Sua dor merece atenção. Reconhecer o abuso é o primeiro passo para recuperar sua liberdade emocional.

Aviso: Este conteúdo tem caráter informativo e não substitui diagnóstico ou acompanhamento profissional. Em casos de sofrimento psicológico, procure ajuda especializada.